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quinta-feira, 8 de agosto de 2019

#Na Rua Especial


Um olhar cronista
Ainda hoje me lembro do meu primeiro bloqueio criativo, era o aniversário da minha mãe, além do presente pensei em fazer uma carta. A ideia ficou somente em minha mente, pois na execução fiquei apenas encarando um pedaço de papel rosa esperando que ele fizesse o trabalho sozinho. A sensação de acabar copiando um poema do Drummond para a própria mão é horrivelmente humilhante.
            Atualmente passo por um bloqueio muito pior motivado por uma simples tarefa: observar e escrever sobre o povo. Passei uma semana encarando as pessoas como um maluco e tudo que elas respondiam era um vazio “bom dia”. Comecei a culpar o mundo por não ser interessante, simplesmente não consegui enxergar uma história por trás de um cumprimento tão sem graça. Foi então que percebi, estava na mesma situação do papelzinho rosa, acusando o instrumento e não seu manejador.
            Notei que não consegui escrever sobre os idosos rindo por que não busquei saber o motivo da gargalhada, não escrevi sobre os meninos brigando pela pipa porque não ouvi os xingamentos.
            Terminando a minha divagação, passei a observar uma nova crônica nascendo, dessa vez com outro olhar.
            - Me empurra moço! – Exclamou um garoto de aspecto sujo com as roupas esfarrapadas extremamente alegre sob um triciclo de brinquedo. Parecia exausto por tentar pedalar sozinho, ofegante e encharcado de suor.
            - Sem tempo. – Respondeu de maneira desleixada o rapaz que passava por perto sem tirar o rosto do celular remendado.
            Pensei por muito tempo o que poderia ter engatilhado a reação do sujeito, deixando aquele garoto para trás sem sequer dirigir-lhe o olhar, não estava vestido para uma entrevista de emprego e muito menos para um encontro. Perguntei-me também, com quem ele estava conversando no celular? Era importante ao ponto de arriscar literalmente a própria vida? Provavelmente não.
            Por fim percebi que não queria aquela mesma existência, procurava um olhar como aquele que eu tinha naquele momento, para ver o mundo mais detalhado e poético, um olhar cronista.
Kaynã
Equipe Imprensa Jovem do Maurício

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